sábado, março 1

Janela



Na foto há uma janela que embora distante, de alguma maneira, talvez pelo ângulo, é o objeto imediato de minha atenção. Uma janela. Era, talvez, a janela do quarto de uma mocinha. Uma moça que passava os fins de tarde debruçada sobre o parapeito da janela a sonhar... Uma moça feliz, por ter seus sonhos e sua janela. Talvez ela tivesse um amor... não se sabe ao certo. Sabe-se, no entanto, que algum sofrimento grande na vida ela teve. E entristeceu-se. Afastou-se das tardes, das janelas e dos sonhos. Afastou-se também do amor. Encheu de grades sua casa mantendo o mundo lá fora. Sim, há uma grade, e atrás dela um muro, e só então, lá no alto, atrás de grade e muro, vê-se a janela, que não é mais a mesma. O abandono e o tempo, e antes o abandono que o tempo, fizeram-na outra, feia e triste, como a casa, em ruínas.
E se acaso ela tivesse, após algumas lágrimas, voltado à janela e lá ficado por mais tempo, e das grades tivesse desistido, e do muro? Talvez os sonhos voltassem trazidos pelo vento e talvez junto com eles o amor, outra vez, novo e vivo. A foto seria outra! Não haveria grade, e se houvesse, os ramos nela abraçados não estariam secos, mas vivos. E não haveria muro, certamente! E as paredes seriam pintadas de alguma cor suave e alegrariam os olhos de qualquer um que passasse e na janela aberta vitrais coloridos transformariam qualquer luz que entrasse no quarto nos mais belos sonhos, os quais o tempo poderia transformar não em ruínas e dor, mas em tardes longe da janela, em tardes a viver sonhos vivos.


Ana Carolina de Senna
em 06 de Fevereiro de 2003

[por ocasião de um trabalho de fotografia: LENDO IMAGENS. A imagem lida foi uma foto que eu mesma bati]

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