É vinte e seis de dezembro, sao onze e meia da manha e acabei de levantar. De levantar, nao de acordar, que estive acordada e deitada, lendo Clarice e Fernando. Mas nao me censurem que o próprio sol por essas bandas nao anda levantando antes das nove da manha. Acabei de reparar pela janela que os carros lá em baixo estao branquiiinhos de gelo. Foi a lua descarada no céu ontem, irritantemente cheia me espiando pela janela, se vangloriando da minha solidao. Aqui é batata, já constatei: quando o céu está limpo é que a noite vai ser muito fria, por isso ver a lua e as estrelas nao alegra tanto, faz a gente pensar no abismo infinito que há entre o ponto em que estamos e a amplidao gelada do espaco sideral, sem nenhuma camadazinha fina de nuvens pra nos proteger. E a pobre árvore aqui do lado da minha janela parece morta, peladinha peladinha. Nem consigo imaginá-la na primavera, mas sei que ficarei muitissíssimo feliz.
Há três dias nao tomo banho, há dois dias nao visto outra coisa que o pijaminha que ganhei da tia carminha, além das meias e pantufas brancas com flores azuis. Meu cabelo já está tao liso e oleoso que vou ter que lavar cinco vezes pra ele recuperar o frescor e o volume. Ontem espremi quatro cravinhos, depois de muito tempo sem precisar dar tal sinal de desestrutura inteiror, e minha pele, que estava quase impecável, hoje mostra os sinais da violência. Ganhei de presente de aniversário a edicao comemorativa de quarenta anos da Nutella, uma embalagem de dooois quilos (!) com tampa dourada. Ah, dois quilos o conteúdo, nao a embalagem. Escondi num cantinho do quarto pra nao olhar pra ela, que nem eu fazia com a boneca grande da Xuxa, de que eu tinha medo porque diziam que ela esfolava suas donas com as unhas enquanto elas dormiam.
Quero pedir desculpas aos leitores fiéis do meu blog pelo silencio que anda se instaurando por lá.. estou de férias, e depois, nao sei o que vem. As explicacoes materias, já as dei, nao tenho acesso à internet em casa, a cidade fica longe e esses dias o RRZ deve estar fechado, ou quem está fechada sou eu. Mas acho que a culpa maior é mesmo da Daienne, que me lancou num estado tal em que eu só quero saber é de escrever cartas. Gostaria enfim de pedir licenca, sem querer ser brusca ou bruta, mas com licenca, gostaria de escrever no blog só quando quisesse. Sei que assim perco a frequencia de um contato que muito me fortalece e preenche, mas no momento é o que dá pra fazer. A vida cotidiana já se tornou banal, e minhas histórias de „hoje fiz isso e aquilo“ eu já nao aguento mais, vou ter que parir outra coisa pra esse blog. Mas nao se desanimem, olhem só há quanto tempo já o tenho, por tantas fases ele já passou, tantas mudancas, e permanece aí.. e permanecerá. Só nao sei ainda como.
Lá fora certamente faz frio abaixo de zero, se o gelo nos carros nao derrete. Mas hoje terei de sair. Vou ao cinema mais tarde. Acho que me submeti a tanta solidao prematuramente. Achei que estava pronta, e no início estava mesmo, dia vinte e quatro estava feliz no meu natal sozinha, achei minha comida uma delícia e tinha o Saramago. Mas as horas quando se está só passam devagar demais, e parece que faz um mês que estou exilada dentro de mim mesma. Dentro de mim é fundo e escuro e acabei me perdendo. Ontem fui uma horinha no quarto da minha vizinha a usar a internet. Entrei no MSN, e pra que? Só pra chorar até dormir depois me contorcendo entre as cobertas de tanta saudade sem remédio. O pior nao é a saudade em si, mas a consciencia de que ela permanecerá por termpo ainda indeterminado. Eram umas quatro da tarde. Aih acordei de novo às nove e comecei a escrever cartas e só parei às duas da manha. No meio tempo é que espremi os cravinhos. Vou ver se hoje arranjo coragem pra tomar banho, gracas a Deus pela Katja e pelo cinema, se nao estou num ponto em que mal consigo me imaginar de outro jeito que nao no meu pijaminha e nas minhas pantufas, de cabelos oleosos e consumida de saudade.
Nao me conformo é que as coisas grandiosas parecem esperar eu ir embora pra acontecer. Tem coisas grandiosas acontecendo na minha família, e eu nao estou lá pra ver de perto. „mas que bobagem, minha filha“, diz mainha, que já cansou de me explicar que o que importa nao é a presenca física, que mesmo eu estando tao longe fisicamente, estou muito mais próxima do que algumas pessoas que ela vê todos os dias aí pertinho dela. Mas sobre isso eu escrevi pra Júlia... escrevi que a proximidade distante é escrava das palavras. Palavras é tudo o que tenho, e palavras é tudo o que vocês tem. E palavras nao podem bastar. Mesmo assim, me empanturro de palavras mais até do que de chocolates, e acho que vou ter que ir ao oculista, que meus olhos já estao reclamando. Quero ler agora Guimaraes Rosa, que a Clarice, o Fernando, o Joao Neto e o Paulo Gustavo dizem que é a melhor coisa do mundo.
Mas vou parar de tagarelices que meu estomago está reclamando alimento. Depois vou tentar tomar banho, torcam por mim. E de hoje em diante proíbo a mim mesma ficar tanto tempo hermitaneando, pelo bem dos meus cravos pela minha sanidade mental. O que voces me propoem?
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